25/08/2023
Possíveis Alterações do Contrato Previdenciário e a aplicação do Código de Defesa do Consumidor

Tema 4: Possíveis Alterações do Contrato Previdenciário e a aplicação do Código de Defesa do Consumidor

Dando sequência projeto “Descomplicando a Previdência”, iniciamos o quarto capítulo da série que tratará das possíveis alterações que podem ser realizadas nos contratos de previdência complementar fechada bem como, se há possibilidade de aplicação do Código de Defesa do Consumidor em eventuais judiciais que delas podem decorrer. Vamos lá?  

 

Na sua grande maioria o contrato de previdência complementar fechada está consolidado pelo próprio Regulamento dos Planos de Benefícios ou em um Termo de adesão a ele já que o regulamento do plano possui as regras estabelecidas entre patrocinador e a entidade fechada com adesão do participante.

 

Assim, considerando a própria natureza da relação previdenciária e o extenso período que vigora o contrato previdenciário, é natural que tal instrumento passe por algumas alterações ao longo do tempo buscando o equilíbrio e preservação do plano.

 

Tais mudanças poderão ser simples como, por exemplo, mudança no nome do plano, correções de remissões, ajustes ortográficos ou elevação dos valores de resgates, adequações legais de natureza formal, ou então alterações mais complexas tais como ajustes de premissas atuarias evolvendo método atuarial e regimes financeiros, assim como outras que trataremos mais detalhadamente nos capítulos seguintes e que impactam diretamente o plano e seus beneficiários, sendo elas: (i) Fechamento e Saldamento do plano: (ii) Transferência de gerenciamento: (iii) Migração e (iv) Retirada de patrocínio.  

 

Vale destacar que independentemente da modalidade de alteração, é certo que aos aposentados, pensionistas e participantes elegíveis deve ser garantido o direito adquirido, assim como o direito acumulado dos participantes não elegíveis ao benefício contratado, sendo ilegal e/ou inconstitucional, alterações que afrontem tais condições.

 

Seguindo essa lógica a PREVIC (órgão fiscalizador) orienta no sentido de que, apesar de haver a possibilidade de alteração das regras, deve-se buscar a máxima estabilidade das regras do plano ao longo do tempo, evitando, na medida do possível, a realização de sucessivas alterações, de modo a não dificultar o entendimento por parte dos participantes (Guia de Melhores Prátias,2023).

 

Contudo, é importante lembrar que, durante um longo período foi discutido pelo Poder Judiciário qual seria o regulamento aplicável aos participantes – se o da época da adesão ou o da data em que se tornou elegível a determinado benefício. E isso porque muitas vezes o regulamento passava por mudanças que iam além do necessário, ocasionando alterações que retiravam direitos inicialmente previstos.

 

Embora todo o esforço das entidades sindicais e associativas de participantes e aposentados, ficou determinado pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça) que o regulamento aplicável é aquele da data que se torna elegível, ainda que as mudanças não tenham sido apenas as necessárias, (Tema 907), de modo que a judicialização no caso concreto para hipóteses em que as mudanças não observem o direito adquirido e/ou acumulado, permanece ocorrendo.

 

 

CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR: APLICÁVEL OU NÃO AOS CONTRATOS DE PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR FECHADA?

 

Considerando as informações acima quanto às possíveis alterações nos regulamentos de previdência complementar/contrato previdenciário, fica o questionamento quanto a aplicação do código de defesa do consumidor no caso de eventuais discussões que podem envolver cada uma delas, em especial as que promovam afronta a direitos dos participantes e assistidos.

 

Para responder tal questionamento, destacamos o entendimento proferido pelo STJ no julgamento do Resp 1.536.786-MG em 20.10.2015 segundo o qual seria inaplicável o Código de Defesa do Consumidor aos contratos previdenciários celebrados com entidades fechadas de previdência complementar, entendimento consolidado na Súmula 563 do STJ.

 

Isso porque a Lei n. 109/2001 estabelece a gestão compartilhada do Plano de Benefícios entre representantes dos participantes e assistidos e dos patrocinadores nos órgãos internos de governança (Conselho Deliberativo e Fiscal), o que afastaria a desigualdade de forças entre eles. Também foi considerado para o entendimento que a ausência de finalidade lucrativa da EFPC descaracterizaria a relação de consumo, afastando assim a aplicação da norma mais protetiva.

 

No entanto, discorda-se do entendimento tomado pelo STJ por maioria de votos, uma vez que, mesmo diante da possibilidade de composição compartilhada dos assentos nos órgãos de deliberação, a realidade mostra que não há de fato paridade de forças entre os representantes dos participantes e assistidos e a patrocinadora, especialmente porque à patrocinadora é garantido o voto de qualidade, de modo que todas as mudanças acabam por ser aprovadas, ainda que em prejuízo de seus beneficiários.

 

Ademais, conforme destacado em voto vencido proferido pelo Ministro Luiz Felipe Salomão, o simples fato de a entidade fechada de previdência privada não possuir finalidade lucrativa, não lhe retira a qualidade de fornecedora de serviço de administração do plano e tampouco desqualifica os participante e assistidos da condição de consumidor, uma vez que há a prestação de serviços, resta um serviço aos seus segurados, qual seja, a custódia e administração dos valores que lhe são repassados por estes, a título de contribuição previdenciária.

 

Nota-se, portanto, não apenas a necessidade de revisitação dos entendimentos e normas estabelecidas no âmbito da previdência complementar fechada, mas também a necessidade de fortalecimento da atuação dos representantes dos participantes e assistidos nos órgãos de deliberação dentro das Entidades Fechadas de Previdência Complementar na luta pela garantia dos direitos conquistados e melhoria das condições possíveis.

 

No próximo capítulo trataremos de forma detalhada das principais formas de alteração do regulamento dos planos de previdência submetidas ao processo de licenciamento junto a PREVIC.

 

Esperamos que estejam aproveitando essa jornada de aproximação e apropriação dos conceitos de previdência complementar fechada! Até breve.